1.
Recorrente:
1.1.
RE, com repercussão geral, impugnando
inconstitucionalidade ao art. 28 da Lei 11.343/2006, que criminaliza a posse ou
cultura de drogas, com sanções de prestação de serviço, advertência sobre as
consequências e medida educativa de presença em curso ou programa educativo.
1.2.
Essa tipificação para consumo pessoal violaria o art. 5º, X/CF, em que se
determinam como invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem
das pessoas à há
proteção do espaço privado enquanto não prejudicador de terceiros; portanto,
para criminalizar, deveria haver lesão a
bens jurídicos alheios.
1.3.
Ademais, o art. 28 da Lei de Drogas tem como
pressuposto a não extensão do fato para além da individualidade do agente, o
que elucida a injustificada edição da norma em questão.
2.
MP:
2.1.
O bem
jurídico tutelado é a saúde pública, pois as condutas prescritas coadunam
socialmente para a difusão do vício.
2.2.
Embora não haja pena privativa de liberdade,
isso não tem por consequência a extinção da natureza penal dos comportamentos
criminalizados.
2.2.1. Não se
deve adotar rigor técnico.
3.
A impugnação realizada se dá pelo viés da
incompatibilidade com garantias constitucionais de intimidade e vida privada à proibição
constitucional de crimes que apenas concernem à pessoalidade do agente.
3.1.
Do controle
da constitucionalidade de normas penais:
3.1.1. Divergências
entre direitos fundamentais e sua proteção – direito coletivo à saúde e
segurança x direito à intimidade e à vida privada à parâmetros
e limites do controle de constitucionalidade de leis penais, principalmente
em consideração àquelas que objetivam conter riscos a bens jurídicos
essenciais.
3.1.2. CF
tipificou inúmeras condutas (art. 5º, XLI a XLIV; art. 7º, X; art. 227, SS4º,
art. 225, SS3º) à demonstra importância em proteger
direitos perante o Estado e também garantir direitos fundamentais de lesões
causáveis por terceiros à DFs são,
portanto, proibições de intervenção (ou
de excesso) + postulado de proteção (ou
proibição de proteção insuficiente).
3.1.3. Nem sempre
há pretensão subjetiva, porém subjaz o dever estatal de realizar ou
substancializar direitos fundamentais.
3.1.4. Discrição
legislativa para proteção de bens jurídicos fundamentais, incluindo medidas
penais à limitação pelo princípio da
proporcionalidade à excesso no processo legislativo: desproporcionalidade
meio-fim, contraditoriedade, incongruência ou irrazoabilidade à apreciação
da necessidade e da adequação da
forma adotada para a consecução dos objetivos à meio não é necessário se houver outro
modo adequado e menos gravoso à
parâmetros para o controle de constitucionalidade penal.
3.2.
TC alemão à três
patamares de intervenção/restrição aos DFs que podem ser relevantes para
controle de lei penal.
3.2.1. Controle de evidência: espaço
ao legislador de avaliação, valoração e conformação. Lei seria inconstitucional
se evidentemente inidônea para proteção do bem jurídico.
3.2.2. Controle de justificabilidade: análise
acerca do fato de a legislação ter sido elaborada após apreciação objetiva e
justificável das formas de conhecimento possíveis, isto é, dos fatos/dados da
realidade social de então à
considerou os efeitos da aplicação da norma dentro de sua margem de ação.
3.2.2.1.
Fatos
legislativos são relevantes na apreciação do parâmetro constitucional.
3.2.2.2.
Apenas verificando se, para a concepção da
política criminal, o legislador valeu-se de dados é possível determinar a
utilização da margem de ação de forma justificada ou não.
3.2.3. Controle material
de intensidade: intervenções legislativas que, pela intensidade com que
afetam aos bens jurídicos relevantes, devem ser submetidas a um rigoroso
controle constitucional.
3.2.3.1.
Pela gravidade da interferência, o Tribunal
pode negligenciar as valorações fáticas legiferantes para averiguar se a mesma
é necessária e justifica-se por elevada imprescindibilidade para afetar
direitos fundamentais.
3.2.3.2.
Deve ser observado se o legislador não poderia
ter adequadamente garantido o direito de modo menos oneroso, com uma
regulamentação inferior, ou era inexoravelmente compulsória à exame
da ponderação do legislador de proporcionalidade entre intervenção e
objetivos.
3.3.
Considerações
sobre os crimes de perigo abstrato.
3.3.1. Crimes de perigo abstrato: não há
necessariamente efetiva lesão ao bem jurídico regulado pela norma à a criminalização é pressuposta com
base em um gênero de condutas que carregariam em si certo perigo indesejado a
um bem jurídico, mesmo que não se concretize.
3.3.1.1.
Presunção absoluta sobre periculosidade de
conduta ao bem jurídico protegido à perigo abstrato, delito se consuma
apenas com a realização do comportamento descrito no tipo penal.
3.3.1.2.
É geralmente o modo mais eficaz de garantir
bens difusos ou coletivos, como meio ambiente e saúde pública à direito
penal preventivo.
3.3.1.3.
A corte afere a potencialidade da lesão aos
bens jurídicos que passaram a ser tuteladas através da tipificação penal.
3.4.
Posse de
drogas para consumo pessoal: políticas regulatórias
3.4.1. Proibição: determinar sanções criminais acerca
da produção, distribuição e posse de drogas não medicinas ou de fins
científicas à normas penais.
3.4.2. Despenalização: excluir
pena privativa de liberdade quando da posse para consumo pessoal, além de
outros comportamentos de ofensividade reduzida, sem descriminalizá-las (é o
caso da posse de drogas em tela).
3.4.3. Descriminalização: excluir
qualquer sanção criminal para posse de drogas de uso pessoal. Não é crime, mas
também não foi legalizada; o comportamento permanece censurado
administrativamente.
3.4.4. Redução de danos e de prevenção de riscos: programas
e práticas que intentam extinguir as decorrências sociais reprováveis advindas
do consumo de drogas, legais ou ilegais, psicoativas.
3.4.4.1.
Campo
penal -> saúde pública = descriminalização
+ políticas de redução e de prevenção de danos.
4.
Análise da
norma impugnada.
4.1.
Adequação
da norma impugnada: controle de evidência e de justificabilidade.
4.1.1. Controle de evidência (medidas
idôneas para proteção):
4.1.1.1.
Para uso pessoal, não há pena privativa de
liberdade; há para usuários e traficantes.
4.1.1.2.
Entretanto, a criminalização do porte para uso
pessoal não atende aos objetivos almejados quanto à saúde e ressocialização de
usuários e dependentes.
4.1.1.3.
Mesmo com a despenalização, a tipificação tem
por consequência a estigmatização e reduz as finalidades expressas no SISNUD
quanto à redução de danos e prevenção de riscos, globalmente profusas à houve tratamento legal distinto para a participação no tráfico,
porém não há diferença clara entre usuário e traficante à todos acabam considerados
traficantes.
4.1.1.4.
Da pesquisa,
depreende-se que:
4.1.1.4.1.
A maioria é
presa em flagrante, em abordagem de suspeitos, sozinhos e com menos de 100g de
droga; exerce alguma atividade profissional e são jovens entre 18 e 29 anos,
negros e pardos; sem antecedentes.
4.1.1.4.2.
Uma reduzida
minoria estaria envolvida com organizações criminosas.
4.1.1.4.3.
A informação
dada pelos policiais costuma ser a única para que o suspeito seja condenado
[como traficante].
4.1.1.5.
Conclusão: Há incongruência entre criminalização para consumo
pessoal e os objetivos legislativos quanto a usuários e dependentes à agrava-se o fato pela indistinção entre usuário e
traficante; há, portanto, inadequação da
norma impugnada à violação da
proporcionalidade.
4.1.2. Controle de
justificabilidade.
4.1.2.1.
Nada indique que repressão = melhor forma de
combate ao tráfico; mesmo com “guerra às drogas”, aumentou o tráfico.
4.1.2.2.
A situação é
oposta quanto à despenalização e à descriminalização à criminalização não influencia quanto ao consumo.
4.1.2.3.
Nem mesmo os
dados disponíveis à época demonstravam com segurança que a incriminação da
conduta seria sustentável.
4.1.2.5.
O projeto de Lei demonstra
a contrariedade entre os meios aplicados e os fins ansiados, evidenciando o
usuário como vítima; não se buscou informações técnicas quanto à posse para uso
pessoal e a tutela do bem jurídico.
4.1.2.5.1.
Incoerência: medidas
educativas à penas.
4.1.2.6.
Conclusão: criminalização do consumo pessoal não está em
compatibilidade com o princípio da proporcionalidade.
5.
Necessidade da norma impugnada: controle material de
intensidade.
5.1.
Averiguar se
intervenção legislativa em DFs é necessária para a proteção de bens jurídicos
relevantes.
5.2.
Criminalização
para consumo pessoal à direito penal não seria o instrumento correto, pois não
há bem jurídico ‘assegurável’: o dano é pessoal.
5.3.
Tese do
perigo abstrato à saúde à saúde coletiva = sem
mercado de tráfico (= sem consumo); tráfico = + crimes contra patrimônio e
violência.
5.4.
Análise da intensidade da intervenção e os fundamentos justificantes (proporcionalidade).
5.5.
Colisão entre
DFs à noção de núcleo
de proteção de DFs: “fração da vida
protegida” por este direito à pode
ser mais amplo ou restrito e portanto varia a restrição desse DF.
5.5.1. Direito não limitado + restrições = direito limitado à teoria externa:
não há relação necessária, posto que essa se dá em virtude da compatibilização
entre DFs.
5.5.2. Teoria
interna: direito e restrição não são
autônomos; conformam a ideia de direito fundamental com conteúdo à restrição = limite,
conteúdo do próprio direito. à limites dos limites: constitucionais ao
legislador; proteção do núcleo essencial do DF e clareza, determinação,
generalidade e proporcionalidade das restrições.
5.5.2.1.
Garantias institucionais: essência deveria ser garantida constitucionalmente.
5.5.3. O princípio da
proteção do núcleo essencial procura impedir o esvaziamento do conteúdo do
DF por restrições.
5.5.3.1.
Teoria absoluta: o
núcleo, autônomo, sempre estaria protegido de decisão legislativa, independente
qualquer caso concreto. Interpretação material de espaço livre de
interferências do Estado à insuscetível de
limitação, limite do limite.
5.5.3.1.1.
Pode ser fórmula
vazia à dificuldade in
abstracto de encontrar esse núcleo; pressupõe elementos centrais e
acidentais; pode sacrificar o direito.
5.5.3.2.
Teoria relativa:
núcleo
é definível casuisticamente, consoante à consecução desejada pela restrição à ponderação meio-fim, de acordo com a
proporcionalidade à núcleo insuscetível de restrição/redução.
5.5.3.2.1.
Flexibilização exagerada: DFs deixam de ser princípios centrais do sistema.
5.5.3.3.
Ambos intentam proteger os direitos
fundamentais face às decisões legislativas desarrazoadas; todavia, há deficiências
em ambas.
5.5.3.4.
HESSE: conciliação
à há no princípio da proporcionalidade
proteção contra arbitrariedades legislativas + contra lesões ao núcleo dos DFs.
5.5.3.4.1.
Proporcionalidade
deve
significar tanto adequação da limitação ao objetivo quanto compatibilização entre
fim e direito interferido.
5.5.3.5.
Na CF brasileira,
há limite do limite na cláusula que veda emenda tendente a abolição dos DeGF.
5.5.4. Possíveis
soluções à colisão de
direitos em sentido estrito (= entre
DFs) ou em sentido amplo (= entre
DFs e outros valores que protejam interesses comunitários ou entre direitos
fundamentais individuais e direitos coletivos e difusos). à hierarquia
rigorosa entre DFs retiraria a unidade da CF enquanto complexo normativo.
5.5.4.1.
CC alemã: colisão
entre direitos individuais x valores jurídicos de hierarquia constitucional à pode haver limitação a direitos individuais que não eram
expressamente restringidos por lei.
5.5.4.2.
A ponderação deve
se dar pela concordância prática.
5.5.4.3.
POSSE DE DROGAS PARA CONSUMO PRÓPRIO: SAÚDE E SEGURANÇAS
PÚBLICAS.
5.5.4.3.1.
Acerca da
importância de interesse coletivo com tutela penal, exige-se o dano potencial à
conduta criminalizada à como os riscos a que sujeitam os interesses coletivos justificam sua transformação em
proteção penal.
5.5.4.3.2.
Para PUIG, a
intervenção em direito coletivo só é justificável se há certo nível de
lesividade individual que justifiquem a interferência do direito penal nessa
matéria (tabaco não se criminalizou: medidas administrativas de restrição de
consumo em locais públicos).
6.
Alternativas à criminalização
7.
Manutenção das medidas do art. 28 da Lei 11.343/2006
8.
Apresentação do preso por tráfico ao juiz competente
8.1.
Tratando-se
das medidas da norma impugnada como de natureza puramente administrativa, não
haverá prisão em flagrante e condução coercitiva ao juiz ou à delegacia.
8.2.
Há ainda
prisão por posse, conforme art. 50, quando do tráfico (determinado por
policial, art. 33) à haverá prisão em
flagrante à apresentação imediata me juízo seria ideal quanto à
segurança da classificação tráfico x uso pessoal, até que haja legislação com
parâmetros mais objetivos.
9.
Dispositivo
9.1.
Provimento ao RE
para:
9.1.1. Declaração de
inconstitucionalidade do art. 28, retirando-lhe
todo efeito penal, cabendo medidas administrativas até a respectiva legislação
da matéria.
9.1.2. Interpretação
conforme, para que o autor da conduta
prevista no art. 48, SS1º e 2º seja notificado para comparecimento em juízo.
9.1.3. Interpretação
conforme ao art. 50, de modo que o preso
em flagrante por tráfico tem, como condição para transição prisão em flagrante à preventiva, a imediata apresentação ao juiz.
9.1.4. Absolver o
acusado, por conduta atípica.
9.1.5. Determinar ao
CNJ (Conselho Nacional de Justiça)
providências para que:
9.1.5.1.
Órgãos passem
a se articular para aplicar as medidas da norma impugnada em procedimento
cível.
9.1.5.2.
Articular
estratégias preventivas e de recuperação dos usuários de diversas drogas.
9.1.5.3.
Regulamentar
a audiência de apresentação do preso ao juiz.
9.1.5.4.
Demonstrar
relatórios das providências.
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