domingo, 26 de abril de 2020

Agravo Regimental em Recurso Extraordinário 241.757-2 MA, Rel. Min. Maurício Corrêa


RELATÓRIO – Foi negado seguimento ao RE, com base no art. 21, SS1º do RISTF, no qual se alegava a lesão ao direito à educação em rede pública, em São Luís, MA, aos deficientes auditivos, não tendo sido assegurada a sua oportunidade de acesso ao ensino fundamental (art. 30, VI e art. 211, SS2º/CF), argumentando ainda o fato de haver direito de repasse de verbas pelo município para essa função. O tribunal considerou-o insubsistente, com fundamento no fato de que: i) não é o MS meio de ação de cobrança (Súmula 269 do STF), ii) não há direito líquido e certo em relação às verbas, dado que não há previsão legal do repasse.

Os óbices para tanto foram superados pelo provimento de AgR, segundo a recorrente. Objetiva, quanto ao mérito, a determinação de abertura de vagas pela Prefeitura e Secretaria da Educação e, caso não seja possível, estabelecer repasse mensal à entidade, além de dívida anterior. Entende ainda que:
1)                            A Súmula não seria aplicável, pois a finalidade da ação é assegurar garantia constitucional de ensino fundamental.
2)                           Não é possível alegar ausência de previsão legal para repasses para prestação de ensino especializado, posto que se trata de entidade privada de assistência social e de utilidade pública.
3)                           Ensino fundamental e educação infantil se tratam de competência exclusiva municipal, com cooperação da União e do Estado, de modo que a ausência destes não pode configurar escusa para concreção do dever constitucional.
4)                           As verbas do Fundo de Participação foram repassadas ao Município, que as desviou, conforme relatório de IC do MPF.
5)                           Há direito líquido e certo para que haja deferimento, afastando a Súmula e dando prosseguimento ao RE.

VOTO – Min. Maurício Corrêa (Relator) – Inicialmente, é apontado que o provimento do agravo de instrumento não implica na superação dos óbices anteriormente suscitados para indeferimento do RE, conforme o art. 316/RISTF (não prejudica o exame do julgamento acerca do cabimento do recurso denegado).

Ademais, as alegações acerca do mérito pautam o afastamento da aplicação da Súmula 269; a necessidade da edição de lei sobre verbas à entidade privada de assistência social e as competências, concorrente e exclusiva, do Município. Não há na norma constitucional nada que se permita a conclusão da obrigação pretendida de abertura de vagas para deficientes, nem de equivalência ao padrão do ensino da respectiva Associação (ao que feriria o art. 206, II e III/CF se o fizesse). Ainda, não foram atendidas as condições do ensino pela iniciativa privada (que poderiam revelar seus “padrões de ensino”) e o MS não seria o correto para apuração da responsabilidade do órgão competente em relação ao não-oferecimento (art. 208, SS2º/CF).

Sobre o pedido alternativo da agravante, segundo o art. 223, I e II/CF, além do reconhecimento como utilidade pública e assistência social, é necessário comprovar que não há fins lucrativos e aplicação do excedente na educação; ainda, a própria entidade admitiu a necessidade de convênio, que compete ao ente público e sua respectiva liberdade de celebrar contratos – assim, não há direito líquido e certo na ação. O caráter de ação de cobrança se evidencia com o final do pedido, em que se exige pagamento de dívida contraída em trabalho social, incidindo, portanto, a Súmula. O direito líquido e certo também não se consubstancia a partir da alegação do desvio de verbas do FNDE pela Prefeitura, que, conforme relatório, ainda depende de exame aprofundado pelo TCU.
Nega provimento ao AgR.

VOTO – Min. Nelson Jobim – Da análise das competências, não há indicação de direito, subjetivo, individual ou coletivo. Com um pedido baseado em obrigações alternativas e sucessivas, a entidade pretende receber verba sem ter havido dotação orçamentária, sem convênio e sem as cautelas necessárias. Quanto ao desvio, o MP investiga apenas se o Município não aplicou as verbas corretamente, de modo que não seria, numa conclusão geral, viável requerer do Judiciário uma intervenção nas políticas públicas ou interferir na destinação de verbas com base em uma norma de distribuição de competências. Nega provimento.

VOTO ­– Min. Marco Aurélio – O art. 208, III, auto-aplicável, seria suficiente para compelir ente público a fornecer educação especializada, com disposição sobre os recursos imprescindíveis dessa obrigação no art. 212. Para o Ministro, até mesmo o MS seria via para exigir direito líquido e certo dos deficientes físicos à educação, evidenciado no fato de que tratam de normas de eficácia plena (sem necessidade de complementação).

Há pedidos sucessivos, em que, não sendo satisfeito o de maior valia, o Judiciário analisa o passo seguinte, e pedidos alternativos, como no caso, em que há a possibilidade de escolha: proporcionar por escolas públicas o ensino especializado ou repassar recursos, conforme o art. 213, “a escolas comunitárias, confessionais ou filantrópicas, definidas em lei”. A definição caberá ao “estado-gênero”, face ao acórdão mandamental.

Provê o agravo.

VOTO – Min. Néri da Silveira – As normas não podem ser consideradas como auto-aplicáveis, posto que há um evidente princípio programático nelas e, por conseguinte, exigem procedimentos de integração.

Destarte, MS não é via adequada para obtenção dos direitos constitucionais, pois não há direito líquido e certo, mas que exige providência de natureza administrativa. Dever-se-ia optar por ADIn (explicitando a omissão do Poder Público em relação às determinações da CF; daí, deveria adotar as providências necessárias) ou MI. Essas seriam as providências, dado que se trata de medidas administrativas para incluir no orçamento as dotações necessárias, o que a ADIn cumpriria com perfeição.

Acompanha o relator, não provendo o agravo.

EXTRATO DE ATA – Por maioria, o AgR teve seu provimento negado, vencido o Min. Marco Aurélio.


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