1.
EMENTA.
a. É dever
constitucional do Poder Público a proteção da flora e também incumbe a ele alcançar o equilíbrio ambiental.
Todavia, Pelas limitações estatais à propriedade, deve haver indenização.
b. Mesmo com
a proteção jurídica das coberturas vegetais, o dominus pode, adequada e racionalmente, se aproveitar das árvores
no viés econômico, respeitando o Código Florestal.
c. A jurisprudência
entende que, por respeito à garantia constitucional de propriedade, as áreas privadas
as quais o Estado se apossar ou limitar administrativamente podem ser
indenizadas pelas matas que as recobrem.
d. Competência
de criação de reservas não decorre em isenção quanto à responsabilidade de
indenizar compensatoriamente quando do impedimento ou prejuízo da exploração
econômica do imóvel.
e. O art.
225, SS4º/CF deve ser aplicado harmonicamente em relação ao sistema jurídico,
inclusive com a compreensão de propriedade e suas projeções no art. 5º, XXII.
i.
A referida norma não converte as propriedades que contenham florestas ou matas em bens públicos, além de não proibir a utilização pelos
particulares dos recursos naturais da
área particular, observando as prescrições legais e atendendo à preservação
ambiental.
f.
Há tutela efetiva ao direito da
propriedade. A proteção constitucional abrange o reconhecimento da
compensação financeira ao dominus em
todos os casos que o Estado, juridicamente, afetar a propriedade na dimensão
econômica, mesmo que localizado nas
áreas referidas pelo art. 225, SS4º.
g. O direito ao meio ambiente ecologicamente
equilibrado é a consagração de um direito de terceira geração – art. 225, caput/CF.
2.
ACÓRDÃO.
a. Por
unanimidade, não conhecimento do RE.
3.
RELATÓRIO.
a. Estado de
SP recorre de decisão do TJ que o condena à indenização de proprietários de
imóvel rural abrangido por área destinada à criação de estação ecológica, de
acordo com ato da Administração estadual.
b. Diz o
acórdão impugnado:
i. O primeiro
a ser tratado é a indenizabilidade.
ii. A posição
do relator é de que: com a inindenização,
restrição administrativa à confisco,
posto que não é vedada a utilização econômica da mata da área particular;
ademais, a proteção dada pela lei às matas confere à propriedade expressão
econômica, ressaltando que a terra com esse acessório (art. 43, I/CC) terá
maior valor, pelo que deve haver indenização no caso de expropriação.
iii. A
indenização seria, no máximo, de 50% da totalidade das matas, dado que esse é o
percentual limite de derrubada das árvores – nunca haveria lucro total.
iv. Não há fundamento no
argumento de que a Constituição apregoa
a inexigibilidade de indenização por ato administrativo com objetivo
ecológico, posto que esta ainda protege o direito de propriedade, desde que
cumpra sua função social, e, para a desapropriação, deve haver indenização,
salvo os casos previstos.
v. Não há no art. 225, parágrafo único, inciso
VII e parágrafo 4º a ilação da ré de que terras localizadas na Serra do Mar não sejam indenizáveis quando da
desapropriação ou apossamento administrativo por se constituir patrimônio
nacional.
c. Sustenta a
recorrente:
i.
As propriedades na Serra do Mar, integrantes
da Mata Atlântica, são patrimônio
nacional, sendo designadas como bem
de uso comum do povo, indisponíveis (não comercializáveis).
ii.
A propriedade deve ser exercida com sua função
social; não desmatar, numa
propriedade na Serra do Mar, é inerente
ao direito. É a única interpretação possível, destacando-se de que a propriedade não foi extinta na Serra do Mar.
iii.
Há apenas limitação administrativa, segundo as
restrições constantes em lei ordinária; essas limitações não ensejam
indenização, posto que o direito na
Serra do Mar é inerentemente menor.
d. O
Ministério Público Federal conheceu e proveu o recurso.
4.
Voto –
CELSO DE MELLO.
a. O Tribunal
entende que a exploração econômica dos imóveis rurais foi inviabilizada por
atos da Administração, posto que, transformadas em Estação Ecológica, não se
submetem mais à exploração de madeira, determinando a reparação civil pelo
Estado por sua atividade do Poder Público.
b. O
esvaziamento econômico da propriedade é evidenciado no indeferimento de remoção
de parcela da cobertura vegetal do imóvel rural para cultura de cacau em
virtude de localizar-se pela Estação Ecológica. Destarte, há impossibilidade de
exploração econômica da propriedade dos recorridos.
c. Entende
que a decisão do TJSP é incensurável.
d. A proteção
da flora e a manutenção do equilíbrio ambiental não isentam o Estado da
indenização dos proprietários prejudicados economicamente pelas limitações
impostas pela Administração.
e. Desapropriações,
apossamentos administrativos ou restrições legais fazem nascer o dever do Estado de ressarcimento dos danos advindo da atividade
pública quando decorrer no esvaziamento do conteúdo econômico do direito de
propriedade, como é o caso em tela.
f. Reitera-se
o argumento em 1.b (possibilidade de
exploração econômica legalmente) e em 3.b.ii
(deve haver indenização, ou seria confisco).
g. Assim, o
acórdão impugnado está em consonância com a jurisprudência do STF, que
reconhece a plena ressarcibilidade de prejuízos materiais decorrentes de
limitações administrativas que diretamente causem esvaziamento econômico.
h. O fato de
o Código Florestal instituir florestas e formas úteis de vegetação como bem de
interesse comum não desobriga nem veda a necessidade de indenização em
situações de limitação administrativa que esvazie parcial ou integralmente a
exploração dos recursos naturais, retirando o conteúdo essencial de direito da
propriedade.
i. Coberturas
florestais e revestimentos não são
fatores economicamente neutros no momento de determinação do justo valor da indenização à há “indiscutível expressão econômica”, resultando na necessidade de
indenização do dominus com a
consideração do valor patrimonial representado por eles.
j. Reitera-se
argumento em 1.d (competência não
exonera Estado da indenização) à Estado
pode constituir reservas, mas não gratuitamente, à custa de particulares.
k. Argumento
de 3.b.iv.: se aceita a tese da
inexigibilidade teoricamente decorrente da nova ordem constitucional, veríamos
a nulificação do direito de propriedade e consequências graves advindas daí.
l. Os
preceitos do art. 225 consagram o
direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado – direito de 3ª
geração, subjetivamente indeterminado, que atende a todos do grupo social à proteção da flora e extirpação de
formas que prejudicam a sua função ecológica são instrumentos de efetividade
desse direito.
m. Todavia, esse dever constitucional não tem por
consequência a desoneração do Estado.
n. A norma
constitucional não opera em favor da transmissão das propriedades ao Poder
Público, bem como não veda a utilização pelos particulares dos recursos
naturais da área particular, reafirmando com a exposição de Miguel Reale.
o. Como o direito à preservação da integridade
ambiental é um direito subjetivamente indefinido, não cabe apenas aos
proprietários das áreas limitadas os ônus que dele decorrem do Estado, em
virtude do cumprimento de seu dever jurídico-social de conservação em prol da
sociedade.
p. Argumento 1.e.: aplicação harmoniosa – art. 225 e
art. 5º, XXII.
q. Argumento 1.f.: proteção constitucional, garantia
de compensação financeira à a
indenização decorre de prejuízos de ordem patrimonial.
r. A
constituição de uma reserva florestal objetivando a preservação do meio
ambiente não pode ser observada como ação administrativa arbitrária ou
inconsequente, mas instrumento substancial de tutela de valores maiores, que
atende aos interesses de toda a coletividade à assim, é
relevante renegar soluções que neguem ou
sacrifiquem injustamente o direito de propriedade.
s. A criação
de reservas florestais não pode ter caráter
confiscatório, devendo reconhecer-se o direito de propriedade constitucionalmente
previsto, ocasionando no dever estatal da justa compensação reparatória dos
prejuízos.
t. É pacífico
na jurisprudência que, com as limitações administrativas, havendo o
comprometimento ou prejuízo da dimensão econômica do direito de propriedade,
nasce ao Estado o dever de reparação. É assim também com o tombamento.
u. Absoluta soberania quanto ao
pronunciamento jurisdicional acerca da matéria de fato, em que se reconhece o sensível esvaziamento econômico do
direito de propriedade dos recorridos à sem rediscussão das questões fáticas.
v. Não conhecimento do recurso extraordinário.
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