domingo, 26 de abril de 2020

RE 134.297-8



1.                  EMENTA.
a.      É dever constitucional do Poder Público a proteção da flora e também incumbe  a ele alcançar o equilíbrio ambiental. Todavia, Pelas limitações estatais à propriedade, deve haver indenização.
b.      Mesmo com a proteção jurídica das coberturas vegetais, o dominus pode, adequada e racionalmente, se aproveitar das árvores no viés econômico, respeitando o Código Florestal.
c.       A jurisprudência entende que, por respeito à garantia constitucional de propriedade, as áreas privadas as quais o Estado se apossar ou limitar administrativamente podem ser indenizadas pelas matas que as recobrem.
d.      Competência de criação de reservas não decorre em isenção quanto à responsabilidade de indenizar compensatoriamente quando do impedimento ou prejuízo da exploração econômica do imóvel.
e.      O art. 225, SS4º/CF deve ser aplicado harmonicamente em relação ao sistema jurídico, inclusive com a compreensão de propriedade e suas projeções no art. 5º, XXII.
                                 i.      A referida norma não converte as propriedades que contenham florestas ou matas em bens públicos, além de não proibir a utilização pelos particulares dos recursos naturais da área particular, observando as prescrições legais e atendendo à preservação ambiental.
f.        tutela efetiva ao direito da propriedade. A proteção constitucional abrange o reconhecimento da compensação financeira ao dominus em todos os casos que o Estado, juridicamente, afetar a propriedade na dimensão econômica, mesmo que localizado nas áreas referidas pelo art. 225, SS4º.
g.      O direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado é a consagração de um direito de terceira geração – art. 225, caput/CF.

2.                  ACÓRDÃO.
a.      Por unanimidade, não conhecimento do RE.

3.                  RELATÓRIO.
a.      Estado de SP recorre de decisão do TJ que o condena à indenização de proprietários de imóvel rural abrangido por área destinada à criação de estação ecológica, de acordo com ato da Administração estadual.
b.      Diz o acórdão impugnado:
                                   i.     O primeiro a ser tratado é a indenizabilidade.
                                 ii.     A posição do relator é de que: com a inindenização, restrição administrativa à confisco, posto que não é vedada a utilização econômica da mata da área particular; ademais, a proteção dada pela lei às matas confere à propriedade expressão econômica, ressaltando que a terra com esse acessório (art. 43, I/CC) terá maior valor, pelo que deve haver indenização no caso de expropriação.
                                iii.     A indenização seria, no máximo, de 50% da totalidade das matas, dado que esse é o percentual limite de derrubada das árvores – nunca haveria lucro total.
                               iv.     Não há fundamento no argumento de que a Constituição apregoa a inexigibilidade de indenização por ato administrativo com objetivo ecológico, posto que esta ainda protege o direito de propriedade, desde que cumpra sua função social, e, para a desapropriação, deve haver indenização, salvo os casos previstos.
                                 v.     Não há no art. 225, parágrafo único, inciso VII e parágrafo 4º a ilação da ré de que terras localizadas na Serra do Mar não sejam indenizáveis quando da desapropriação ou apossamento administrativo por se constituir patrimônio nacional.
c.       Sustenta a recorrente:
                                  i.         As propriedades na Serra do Mar, integrantes da Mata Atlântica, são patrimônio nacional, sendo designadas como bem de uso comum do povo, indisponíveis (não comercializáveis).
                                 ii.         A propriedade deve ser exercida com sua função social; não desmatar, numa propriedade na Serra do Mar, é inerente ao direito. É a única interpretação possível, destacando-se de que a propriedade não foi extinta na Serra do Mar.
                                iii.         Há apenas limitação administrativa, segundo as restrições constantes em lei ordinária; essas limitações não ensejam indenização, posto que o direito na Serra do Mar é inerentemente menor.
d.      O Ministério Público Federal conheceu e proveu o recurso.

4.                  Voto – CELSO DE MELLO.
a.    O Tribunal entende que a exploração econômica dos imóveis rurais foi inviabilizada por atos da Administração, posto que, transformadas em Estação Ecológica, não se submetem mais à exploração de madeira, determinando a reparação civil pelo Estado por sua atividade do Poder Público.
b.    O esvaziamento econômico da propriedade é evidenciado no indeferimento de remoção de parcela da cobertura vegetal do imóvel rural para cultura de cacau em virtude de localizar-se pela Estação Ecológica. Destarte, há impossibilidade de exploração econômica da propriedade dos recorridos.
c.    Entende que a decisão do TJSP é incensurável.
d.    A proteção da flora e a manutenção do equilíbrio ambiental não isentam o Estado da indenização dos proprietários prejudicados economicamente pelas limitações impostas pela Administração.
e.    Desapropriações, apossamentos administrativos ou restrições legais fazem nascer o dever do Estado de ressarcimento dos danos advindo da atividade pública quando decorrer no esvaziamento do conteúdo econômico do direito de propriedade, como é o caso em tela.
f.     Reitera-se o argumento em 1.b (possibilidade de exploração econômica legalmente) e em 3.b.ii (deve haver indenização, ou seria confisco).
g.    Assim, o acórdão impugnado está em consonância com a jurisprudência do STF, que reconhece a plena ressarcibilidade de prejuízos materiais decorrentes de limitações administrativas que diretamente causem esvaziamento econômico.
h.    O fato de o Código Florestal instituir florestas e formas úteis de vegetação como bem de interesse comum não desobriga nem veda a necessidade de indenização em situações de limitação administrativa que esvazie parcial ou integralmente a exploração dos recursos naturais, retirando o conteúdo essencial de direito da propriedade.
i.      Coberturas florestais e revestimentos não são fatores economicamente neutros no momento de determinação do justo valor da indenização à há “indiscutível expressão econômica”, resultando na necessidade de indenização do dominus com a consideração do valor patrimonial representado por eles.
j.      Reitera-se argumento em 1.d (competência não exonera Estado da indenização) à Estado pode constituir reservas, mas não gratuitamente, à custa de particulares.
k.    Argumento de 3.b.iv.: se aceita a tese da inexigibilidade teoricamente decorrente da nova ordem constitucional, veríamos a nulificação do direito de propriedade e consequências graves advindas daí.
l.      Os preceitos do art. 225 consagram o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado – direito de 3ª geração, subjetivamente indeterminado, que atende a todos do grupo social à proteção da flora e extirpação de formas que prejudicam a sua função ecológica são instrumentos de efetividade desse direito.
m.  Todavia, esse dever constitucional não tem por consequência a desoneração do Estado.
n.    A norma constitucional não opera em favor da transmissão das propriedades ao Poder Público, bem como não veda a utilização pelos particulares dos recursos naturais da área particular, reafirmando com a exposição de Miguel Reale.
o.    Como o direito à preservação da integridade ambiental é um direito subjetivamente indefinido, não cabe apenas aos proprietários das áreas limitadas os ônus que dele decorrem do Estado, em virtude do cumprimento de seu dever jurídico-social de conservação em prol da sociedade.
p.    Argumento 1.e.: aplicação harmoniosa – art. 225 e art. 5º, XXII.
q.    Argumento 1.f.: proteção constitucional, garantia de compensação financeira à a indenização decorre de prejuízos de ordem patrimonial.
r.     A constituição de uma reserva florestal objetivando a preservação do meio ambiente não pode ser observada como ação administrativa arbitrária ou inconsequente, mas instrumento substancial de tutela de valores maiores, que atende aos interesses de toda a coletividade à assim, é relevante renegar soluções que neguem ou sacrifiquem injustamente o direito de propriedade.
s.     A criação de reservas florestais não pode ter caráter confiscatório, devendo reconhecer-se o direito de propriedade constitucionalmente previsto, ocasionando no dever estatal da justa compensação reparatória dos prejuízos.
t.     É pacífico na jurisprudência que, com as limitações administrativas, havendo o comprometimento ou prejuízo da dimensão econômica do direito de propriedade, nasce ao Estado o dever de reparação. É assim também com o tombamento.
u.    Absoluta soberania quanto ao pronunciamento jurisdicional acerca da matéria de fato, em que se reconhece o sensível esvaziamento econômico do direito de propriedade dos recorridos à sem rediscussão das questões fáticas.
v.    Não conhecimento do recurso extraordinário.

Nenhum comentário:

Postar um comentário