1.
EMENTA.
a. Contrato
de depósito bancário.
i.
Proprietário: banco.
ii.
Titular do crédito: depositante (= credor do
depositário).
iii.
Depósito à créditos à se abandonados: são destináveis a
fins sociais (por norma infraconstitucional).
b. Atividade
bancária é disciplinada por normas públicas, inclusive para recadastramento.
c. Constituição regula herança (= direito
privado).
i.
Prescrição e decadência têm seus prazos
determinados por lei infraconstitucional; assim, Lei 9526/97 não é
inconstitucional ao facultar o prazo de seis meses após esfera administrativa
para procurar o Judiciário.
d. Norma com
novos prazos prescricionais não ofende princípio de ato jurídico perfeito, e,
portanto, é aplicável a relações jurídicas em curso.
e. A Lei
supracitada não contraria devido processo legal (há publicação no DOU).
f.
Indeferimento da medida cautelar.
2.
ACÓRDÃO.
a. Unânime
conhecimento da ação.
b. Pelos votos
da maioria, indeferimento da medida cautelar.
3.
RELATÓRIO.
a. PDT propõe
ADI (pedindo medida liminar) sobre a Medida Provisória nº 1597, pela violação
ao artigo 5º da Constituição em seu:
i.
Caput, bem como
seu inciso XXII, tratando do direito de propriedade e seu exercício, pelo
disposto no art. 2º da MP.
ii.
Inciso II (princípio da legalidade), visto que
o art. 1º da MP se baseia em duas
Resoluções do CNM (Conselho Monetário Nacional); por estas serem normas
infralegais, e não leis, não seriam instrumentos corretos para imposição de
obrigações aos cidadãos – “nula será qualquer sanção”.
iii.
Inciso XXX (direito de herança), pois a MP não
considera que pessoas já falecidas eram titulares de contas não recadastradas,
o que privaria os herdeiros de sua herança.
iv.
Inciso XXXV (apreciação do Judiciário), no art. 3º da Medida Provisória, que estabelece prazo
para requerimento de exame judicial quanto ao direito aos depósitos. Mesmo
reconhecendo a possibilidade de estabelecimento de prazo prescricional por
norma infraconstitucional, o prazo reduzido “denota o animus de excluir a apreciação judicial”.
v.
Inciso XXXVI (ato jurídico perfeito) pelo art. 1º, SS 2º do objeto da impugnação,
conforme o qual os saldos não reclamados seriam recolhidos ao Banco Central,
extinguindo os contratos de depósitos quando do recolhimento, desfazendo atos
jurídicos perfeitos que são da esfera privada.
vi.
Inciso LIV (devido processo legal), ao realizar
a expropriação dos bens sem atentar-se ao due
process of law.
b. É pedida a
medida cautelar, pressupondo que os requisitos para sua concessão já
foram preenchidos:
i.
Fumus boni iuris, pela
demonstração de inconstitucionalidade, na violação de princípios
constitucionais.
ii.
Periculum in mora, dado que
o pedido é realizado a pouco tempo antes da MP entrar em vigor.
c. São
refutadas, pela PGFN e pelo ADU, as teses anteriormente apresentadas,
decorrendo na improcedência do pedido do Requerente:
i.
Inexistência
da lesão ao direito de propriedade.
1. Contratos
de depósitos = depósito voluntário e mútuo (arts. 1270, 1256 e 1257/CC).
2. Coisa
depositada: proprietário: banco; depositário: ação de credor pelo direito de
crédito. Portanto, não há direito de propriedade.
ii.
Inexistência
de violação ao princípio da legalidade.
1. O
recadastramento imposto pelas Resoluções do CMN é uma obrigação aos bancos, e
não aos titulares.
2. Os
correntistas poderiam proceder com saque total do depósito; a instituição
financeira não poderia manter a conta de depósito aberta sem atender às
Resoluções.
3. Contas sem
movimentações por muito tempo à res nullius à redisciplina da matéria, com
transferência para a União.
iii.
Inexistência
de violação ao direito de herança.
1. Os
créditos resultantes dos depósitos são transmitidos aos herdeiros, que passarão
a ostentar a condição de titular de conta de depósitos não recadastrada.
iv.
Nada foi
excluído da apreciação do Judiciário.
1. O prazo de
seis meses se inicia com a decisão indeferitória definitiva, se impugnado o
recolhimento ou se houvesse recurso ao CNM, havendo ainda o acesso ao
Judiciário para aquele que não encontrasse solução administrativa.
v.
Não há
lesão a ato jurídico perfeito.
1. Constituição
não proíbe que legislador infraconstitucional possa alterar ou determinar prazo
para o fim do contrato bancário. Portanto, não há lesão a atos jurídicos
perfeitos [...].
vi.
Não há
ofensa ao Due Process of Law.
1. Não há
desapropriação de bens de ninguém, mas incorporação do crédito ao patrimônio da
União (como ocorre com bem vago).
d. O
Congresso Nacional aduz que:
i.
Os princípios constitucionais supostamente
violados devem ser observados numa interpretação sistemática que envolva a
compreensão acerca de patrimônio, competência, liberdade e vida.
ii.
A Lei nº 9526/97 (resultante da conversão da
MP em lei) intenta não permitir a movimentação ilícita de patrimônios, posto
que estariam em contas irregularmente mantidas.
iii.
Lei anterior não previa a solução no caso de
irregularidade de contas.
iv.
Titularidade duvidosa e origem não justificada
afrontam a função social da propriedade, abrindo margem à atuação estatal.
v.
Os depósitos eram feitos em serviço público,
não propriedade privada, de modo que cabe ao Estado o poder de polícia para
impedir prática de ilícitos.
vi.
Não se atenta contra o princípio do ato
jurídico perfeito com a Lei, dado que determinou prazo de prescrição para a
extinção dos contratos bancários.
4.
Voto:
MAURÍCIO CORRÊA.
a. As
Resoluções se destinam aos bancos, e não aos titulares/depositantes.
b. A MP surge
como uma necessidade de superar a não atualização de diversas contas
(“fantasmas”), para então serem eliminadas e encaminhar os recursos decorrentes
delas para projetos de cunho social.
c. Não se
trata de inovação jurídica, uma vez que a Lei nº 2.313/54 trata de matéria
semelhante, ao dispor sobre prazo de extinção de contratos de depósito regular
e voluntário.
d. ... 9 ao
12. (p. 16 e 17).
e. PONTES/CAIO
MÁRIO/SÉRGIO CARLOS COVELLO: Depósito é propriedade do banco; nasce dever de
devolução de coisa da mesma espécie.
f.
Não é depósito comum, mas irregular (devolve-se coisa fungível, art. 1280/CC). Depositário e
depositante tem uma relação de direito pessoal, não de direito real (como prevê
a Constituição) à não há
cautelar quanto a esse ponto, pois não há propriedade.
g. Não há
lesão à legalidade, posto que a Lei visa redisciplinar matéria já tratada e as
atividades bancárias se submetem às normas do Poder Público, na forma das
Resoluções do CMN.
h. A vacância
da herança ainda permite aos herdeiros se habilitarem legalmente para
recebê-la, conforme disciplinado pelo art. 1591/CC. Portanto, não é
inconstitucional por não violar o art. 5º, XXX/CF.
i.
Não há inconstitucionalidade quanto à ausência
de apreciação do Judiciário: o prazo de 6 meses é o da decisão definitiva
do setor administrativo, facultando, posteriormente, o ajuizar do processo.
Ademais, prazos prescricionais também existem no Código Civil, visto que o
constituinte deixou ao alvedrio do legislador ordinário o seu tratamento.
j.
Não há lesão ao ato jurídico perfeito, visto
que há, cf. doutrina e jurisprudência, a aplicação de novos prazos prescricionais
às relações em curso; as contas não recadastradas infringem as disposições
normativas correspondentes e não há norma constitucional que proíba a
determinação ou modificação quanto aos prazos de prescrição e decadência.
k. O devido
processo legal foi respeitado, como se observa a partir da: publicação no
DOU acerca da conta e do depositário, processo administrativo e recurso ao
Judiciário.
5.
Voto:
ILMAR GALVÃO.
a. Acredita
que há direito de propriedade (considerando o crédito como bem móvel, e
propriedade, no sentido amplo, abrangeria todos os ativos, de móveis a
imóveis).
b. Todavia, não
crê que fira o referido direito, posto que são diversas as oportunidades de
reclamá-lo: prazos, edital e prazo de decadência.
c. Não fere a
legalidade, porque tudo fora estabelecido por lei.
d. Feriu o
direito de herança, absolutamente, pois os herdeiros poderiam
ter se habilitado para identificar as contas.
e. Não impede
a apreciação¸ pois não há nenhum impeditivo legal para quem desejar recorrer.
f.
Indefere a medida liminar.
6.
Voto:
MARCO AURÉLIO.
a. A edição
de MPs é excepcionalíssima à dois
critérios essenciais para que sejam legítimas (relevância e urgência).
b. A
importância do critério de urgência é ressaltada com o fato de que a convocação
do Congresso prevista no art. 62/CF só é também encontrada no caso de estado de
defesa.
c. Veículo de
matéria imprópria à vício na
origem, não consubstancia com a conversão de MP em lei à entende que há vício de forma.
d. Entende
que lei superveniente não pode intervir em ato jurídico perfeito que se
prolonga temporalmente.
e. Perda de
bem sem devido processo legal – não houve viabilização do processo; cadastro de
contas dos bancos + publicação da relação com desconsideração do sigilo de
dados no DOU + prazo de 30 dias a partir da publicação para contestar o
recolhimento (ameaça de perda de bem depositado diante de um ato jurídico
perfeito e acabado) + prescrição em 6 meses da ação (imprescindível para
apreciação do Judiciário).
f.
Meio justifica o fim, e não o fim ao meio.
g. Defere a
liminar, com suspensão da eficácia da Lei proveniente da MP.
7.
Voto:
SEPÚLVEDA PERTENCE.
a. Em suma,
suscita a questão de a matéria ser tratada em MP, mas não vê, no caso, a
necessidade do controle de constitucionalidade com base nos critérios de
relevância e urgência.
b. Sobre o mérito, acredita que propriedade,
protegida constitucionalmente, é sinônima de patrimônio, e, portanto,
incluiria o crédito nessa proteção constitucional, dado que compreenderia todos
os direitos de um patrimonial, com base nos incisos XXII e XXIV da Declaração de Direitos.
c. Direito de
crédito é um bem e merece a garantia do devido processo legal.
d. União
legisla ordinariamente sobre perda de propriedade à direito de crédito é protegido
constitucionalmente como propriedade; mas é legítima a perda da propriedade em
nome de sua função social, com base em previsão constitucional.
e. Questiona-se
o problema do ato jurídico perfeito.
f.
Não acredita-se que há periculum in mora na transferência questionada; a declaração de
legitimidade superveniente seria responsabilidade do Banco Central.
g. Indefere
liminar.
8.
EXPLICAÇÃO.
a. Maurício
Corrêa entende que Sepúlveda Pertence não discorda dele totalmente; sua posição
é de que depósito bancário não é propriedade, de acordo com a Constituição e
que ambos concordam quanto às réplicas em relação à violação dos demais
incisos.
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