domingo, 26 de abril de 2020

Introducción al derecho constitucional comparado - Paolo Biscaretti di Ruffìa


·                    RUFFÌA, Paolo Biscaretti di. Introducción al derecho constitucional comparado, Cidade do México: Fondo de Cultura Económica, 2000, pp. 499-519.


I.                  Genealogía de las Constituciones modernas

v    Constituição entendida como lei fundamental em sentido:
A.    Substancial – conjunto de normas jurídicas fundamentais, escritas ou não, que estabelecem a estrutura essencial do Estado.
I.       Todos Estados têm a Constituição substancial. 
B.     Formal – todas as normas jurídicas diversas das legislativas ordinárias, por seu procedimento de elaboração mais complexo, solene e abrangente.
I.       Expedidas por órgãos especialmente constituídos, como Assembleias Constituintes ou referendos, ou por órgãos legislativos comuns, mas com procedimentos dificultados – reuniões das câmaras em sessão conjunta. Contrapõe-se o poder legislativo comum ao poder constituinte ou de revisão constitucional.
a.       Constituições rígidas: apenas modificáveis com procedimentos dificultados.
o   Possibilidade de exercer controle adequado da constitucionalidade das leis ordinárias.
b.      Constituições flexíveis: todas as normas constitucionais substanciais se modificam por procedimento legislativo ordinário.
C.     Documental.
I.       Ato normativo particular e solene que contém as disposições substanciais de caráter constitucional. É a Constituição.
II.    Carta, quando concedida ou outorgada pelo soberano absoluto ou redigida por assembleia e posteriormente aceita pelo monarca (pacto entre rei e povo).
III. Constituição quando é redigida e aprovada por assembleia eleita, confirmada ou não por referendo do corpo eleitoral em conjunto.
D.    O sentido formal e documental nem sempre se identificam, embora apresentem similaridades entre eles. Na Itália republicana, o sentido formal corresponde não apenas ao documental, à Constituinte, mas também a diversas outras leis constitucionais, como o estatuto das cinco regiões de estatuto especial e as leis sobre a Corte.
E.     No final do século XVIII, a Constituição assume significado histórico-político preciso ao indicar os solenes textos legislativos que acolhiam os princípios essenciais das doutrinas em relação à estrutura e funcionamento estatal.
I.       Maior utilização dos conceitos Constituições, Estados constitucionais e constitucionalismo.
F.      Constituição em sentido material – regime político; indicação do conjunto de elementos organizacionais necessários para a subsistência de um Estado determinado, ordenado segundo um mínimo de organização (força política) idônea para apresentá-lo dotado de uma atividade dirigida para um fim político.
I.       Força política e fim político como elementos fundamentais da Constituição nesse sentido.
a.       O desaparecimento de forças políticas que concorreram para aprovação das normas escritas e eleição de fins políticos diversos conduziu à falta de aplicação das normas, substituídas pela prática e pelos costumes harmoniosos com novas forças e novos fins políticos imperantes.
v    A evolução constitucional da época moderna pode ser dividida em dois períodos:
A.    O primeiro, de 1787 a 1918, que sucedeu cinco grandes ciclos de Constituições, inspiradas pelo “constitucionalismo clássico”, das Constituições:
I.       Revolucionárias do século XVIII (1787-1799):
a.       Início com a Declaração de Independência de 1776, nos EUA. Primeira enunciação de caráter universal sobre o direito do povo a autogovernar, seguida por várias Constituições, até se tornar o primeiro texto constitucional federal moderno em 1787, em via da Convenção da Filadélfia.
b.      Influencia o mundo apenas décadas mais tarde, com a independência das ex-colônias espanholas, porém resulta na elaboração de constituições muito distintas em razão do cenário interno das nações.
c.       No que se refere à França, entre 1789 e 1799 surgiram os seguintes textos fundamentais:
o   A Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, depois Constituição, monárquica. Inspira ao inserir a monarquia constitucional sobre novas instituições representativas.
o   Duas Constituições não aplicadas: a dos girondinos e a dos jacobinos; os direitos sociais neles enunciados só seriam aplicados um século mais tarde.
o   Constituição do Diretório, com sua fórmula de governo colegiado, adotado pelas repúblicas.
II.    Napoleônicas (1799-1815):
a.       Constituição do Consulado – três cônsules, Napoleão como primeiro cônsul. Senado-consulto, Napoleão como cônsul vitalício. Constituição do Império – queda em 10 anos, dotado de Constituições especiais. Ata Adicional intenta democratizar parcialmente as instituições para reconstrução imperial.
b.      Aquisição do apoio a Napoleão da burguesia para manter os princípios conquistados durante a Revolução e depois o deixa cair.
c.       Artimanhas de Napoleão orientam Estados autoritários para disfarçar adesão democrática ao arbítrio do chefe.
d.      As inovações administrativas e na legislação napoleônicas se tornaram duradouras e satisfatórias na Europa, além do princípio da igualdade jurídica confirmado durante o período.
III. Legitimistas da Restauração (1815-1830):
a.       Recuperação de fronteiras antigas e do próprio antigo regime.
b.      Monarquias não eram absolutas, mas limitadas, cujo desenvolvimento resultaria em monarquias constitucionais e, depois, parlamentares.
c.       Regra geral: duas câmaras legislativas ao lado do rei; uma eletiva e de sufrágio notavelmente restrito. Permanência da igualdade jurídica.
IV. Liberais (1830-1848);
a.       Descontentamento burguês com a situação político-jurídico após a constituição de autocracias e aristocracias constitucionais.
b.      Doutrina liberal – tentativa francesa de funcionamento da monarquia como parlamentar. Formação de proletariado miserável pela burguesia.
c.       Reform Act amplia o sufrágio e redistribui as cadeiras na Câmara dos Comuns.
d.      Constituição belga significa uma inspiração de modelo para monarquias renovadas nos anos seguintes.
V.    Democráticas, tanto unitárias como federais (1848-1918).
a.       Admissão progressiva de todas as classes no poder, através da extensão do sufrágio e da atuação das regras do sistema parlamentar.
b.      Tendência federalista na Europa influenciada pela vitória norte-americana, porém não alcança impérios plurinacionais - como otomano e austro-húngaro.
B.     O segundo, de 1919 até a atualidade, corresponde a Constituições singulares, conforme formuladas pelos Estados:
I.       De democracia clássica, com Constituições:
a.       De tipo democrático racionalizado (1919 a 1937):
o   Decorrente do desaparecimento dos impérios plurinacionais;
o   Anseio de racionalização dos mecanismos estatais, principalmente parlamentares.
o   Primeiras enunciações extensas dos direitos sociais ao lado dos direitos de liberdade e políticos.
o   Frutos de elaboração doutrinais de gabinete (teóricos) do que apreciações concretas com apoio nas exigências dos Estados.
o   Constituições dos professores – Preuss na Alemanha, Kelsen na Áustria, Posada na Espanha; desembocada em soluções autoritárias.
b.      De tipo democrático social (1946-hoje):
o   Ao fim da Segunda Guerra Mundial, a Europa Ocidental mantém-se fiel ao constitucionalismo clássico, dotado de uma atualização no plano social e racionalização equilibrada das formas de governo, iniciando as Constituições de tipo democrático-social.
II.    Autoritários, segundo o modelo ítalo-alemão:
a.       Mesmos princípios políticos-jurídicos na base constitucional com garantias sendo violadas.
b.      Sem Constituição autoritária no sentido documental.
c.       Portugal e Espanha – suas Constituições eram incapazes de demonstrar a forma de governo, uma vez que a prática constitucional divergia das normas escritas.
III. Socialista-comunista, iniciado na Rússia em 1917:
a.       As Constituições socialistas constituem reproduções visíveis de distintos graus de desenvolvimento, na realização do socialismo e da sociedade comunista.
b.      Três séries constitucionais que distinguem os socialistas pós-guerra:
o   A primeira, de 1945 a 1948, caracterizada pelo caráter provisório, ao tentar inserir novos conteúdos através de formas antigas – Tchecoslováquia, Hungria, Polônia.
o   A segunda, de 1948 a 1954, caracterizada por ser imitação do modelo stalinista de 1936, de ampla difusão – Albânia, Bulgária, Hungria, Alemanha Ocidental, Polônia, România.
o   A terceira, o “degelo” pós-stalinista, em 1954, que conduz as primeiras Constituições socialistas nacionais – Tchecoslováquia, România, Alemanha Oriental, Bulgária, Hungria, Albânia, Polônia.
c.       Iugoslávia, China e Cuba são analisadas à parte.
IV. De Terceiro Mundo (em vias de desenvolvimento):
a.       Constituições baseadas segundo condições de subdesenvolvimento socioeconômico, com textos teóricos; os países latinos e asiáticos costumam adotar caráter presidencial, e os africanos, parlamentar, embora haja tendência presidencial.
v  Distribuição das Constituições de forma geográfica – exemplo: Europa Ocidental (democracia clássica) x Europa Oriental (socialistas).
A.    As Constituições de democracia clássica são muitos similares quantos aos princípios essenciais, porém resultante de que seu contexto histórico, subdivididas em três grupos:
I.       As que remontam ao século XIX: Noruega, Bélgica, Suíça, Luxemburgo e Holanda.
II.    Expedidas após a Primeira Guerra Mundial: Finlândia, Áustria e Irlanda.
III. Posteriores à Segunda Guerra Mundial: Islândia, Itália, Alemanha Ocidental, Dinamarca, França, Chipre, Malta, Suécia, Grécia, Portugal, Espanha e Turquia.
B.     Na América, há o contraste entre o Norte, de Constituições antigas e estáveis – EUA e Canadá –, e a América Latina, de grande diversidade constitucional.
C.     A África apresenta as Constituições mais recentes, contemporâneas da descolonização, após o último conflito mundial, principalmente entre 1957 e 1968, reelaboradas e modificadas no sentido autoritário posteriormente.
D.    Ásia e Oceania em condição análoga, de Constituições socialistas após a vitória da China Popular no continente e de Constituições de tipo ocidental, salvo Estados já independentes, são do mesmo período da descolonização no pós-guerra, a partir de 1947.
 


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