domingo, 12 de junho de 2016

Pensando como um advogado, capítulo 1 - FREDERICK SCHAUER



            O ensaio a seguir refere-se ao questionamento e à análise de SCHAUER quanto à existência de um raciocínio específico no âmbito jurídico, o que designa como “pensar como um advogado”, sentença que nomeia a obra. Segundo ele, o objetivo do ensino jurídico é habilitar para o aluno a ter raciocínio jurídico, e para iniciar esse debate, é proposta uma reflexão, que embasa o texto: “existe realmente essa forma distinta de raciocínio?”.
            Para iniciar a indagação, o autor diz que há algo mais do uma forma de pensamento mais eficaz ou racional em comparação com as outras pessoas, o que descreve como algo próximo de um modo de pensar distinto delas. Portanto, os operadores do Direito não contêm em si uma singularidade em decorrência do seu saber específico – que aparece sob a forma de conhecimento, sustentação oral ou redação –, mas por “algo além”. Em contraposição a essa perspectiva, os realistas manifestam-se por ideia contrária: conforme eles, as decisões da Corte são meros frutos de ideologias, atitudes, preferências próprias daqueles que detêm esse poder, e não pelo raciocínio jurídico pressuposto. Os psicólogos, por sua vez, sustentam que juízes e advogados apresentam idênticas restrições na questão de racionalidade de qualquer um dos tipos de “tomadores de decisão”. Completam ainda os adversários desse ponto de vista a corrente crítica comum – para esta, advogados são seres humanos como quaisquer outros, apresentando os mesmos talentos e restrições – e os céticos – afirmando que há um engodo da realidade, atribuindo peso maior do que realmente existe e que não é compreensível por outros.
            Buscando encontrar o que seria esse raciocínio jurídico, o autor refuta que argumentos (defensores do raciocínio jurídico) como facilidade com averiguação de fatos e provas ou maior compreensão de termos técnicos, assim como empatia, analogia e outras características de advogados sejam suficientes para sustentar tal concepção, pois não são exclusivos desses indivíduos. Igual é a sua percepção em relação àqueles que encontram nas regras positivadas, na preocupação com precedentes ou em raciocínios baseados em autoridade a comprovação, uma vez que tais situações também são comuns no âmbito extrajurídico. 
            Frederick indica não haver pretensão de singularidade, porque se reconhece que o Direito não é um sistema fechado, isto é, não há previsibilidade incondicional sobre o que pode vir a acontecer, o que se conduz à sujeição, no sistema jurídico, não apenas às habilidades explícitas, como também à complexidade imprevisível da condição humana. Em decorrência dessa pouca capacidade de previsão, frequentemente se vê forçado a transcender regras para servir a sociedade da melhor forma. Ademais, “sistema fechado” não pode ser usado para descrição desse mesmo sistema, pois a metodologia aplicada não é exclusiva da área.
            O que SCHAUER anseia demonstrar não é, portanto, que o Direito se demonstre como algo único, mas que certos aspectos estão especificamente concentrados nele. A estranheza específica representada significa que a decisão tomada no sistema jurídico não é necessariamente a melhor possível – aquela que seria tomada em consideração a todos os fatores analisados pelo tomador de decisão, com base na análise da situação com a qual se depara. A peculiaridade do raciocínio jurídico está no fato de ser contraintuitivo, buscando resultados diferentes do que o tomador naturalmente teria escolhido. Com a existência de uma metodologia especificamente dominante e concentrada na argumentação e na decisão no campo do direito, satisfaz-se então a tese do raciocínio jurídico.
            Erigindo sua concepção consoante com a ideia de garantia de um resultado que fosse considerado correto para todos ou para a maior quantidade dos casos particulares, SCHAUER cita COKE para afirmar que é melhor ser demonstrada uma situação de injustiça única (ou pequena) do que adotar uma regra que viesse a prejudicar um grande número de outros processos. Assim, é apresentado o método socrático, que ele afirma ser aplicado por juízes sobre advogados, principalmente em tribunais de apelação: são expressos os fatos e traz-se o questionamento sobre qual seria a possível solução; apresentada a regra que fundamenta essa solução, indaga-se sobre a aplicação da mesma em hipóteses distintas, provocando consequências distintas. Disso advém que, embora no exame específico aparenta-se determinada iniquidade, a melhor (e a que deve ser aplicada) regra é a que produz o melhor resultado em um universo de várias possibilidades. Esses tribunais em específico têm essa preocupação porque o que vier a ser decidido ali se torna precedente, e é imprescindível, destarte, analisar efeitos futuros através de cenários hipotéticos.
            Em suma, a obra demonstra que esse raciocínio moderadamente jurídico está pautado em uma preocupação das aplicações possíveis que difere dos naturais tomadores de decisão sobre o que pode ser considerado iníquo ou errado em casos específicos, aspecto relevante em um governo das leis – posicionado opostamente à individualização e juízos e caprichos pessoais. A afirmação empírica sobre sua subsistência é de que há disseminação em quantidade suficiente para comprovar o pensar como advogado como algo palpável.

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